Cumprindo com a função de informar os cidadãos sobre seus direitos, nesta seção o TeuAdvogado apresenta artigos sobre temas atuais e de interesse comum.

De uma forma objetiva e esclarecedora você poderá saber, nas palavras do TeuAdvogado e de seus seletos convidados, um pouco mais sobre a realidade das coisas que acontecem em nosso país.

 
   
Tolerância Zero
  Paulo Renato Lima de Magalhães Filho
Advogado
Porto Alegre - RS

Nunca se viu tamanha redução da criminalidade nos Estados Unidos como nos últimos tempos. O regime adotado, da tolerância zero, impôs severidade nas autuações e trouxe de volta a credibilidade interna da polícia americana. Este sistema, como se vê, funciona e, assegurando-se as garantias individuais e coletivas dos cidadãos, merece especial destaque em situações onde se passar a mão na cabeça já não resolve mais nada.

E no Brasil? O descrédito de nossas instituições – não só da polícia – é motivo de zombaria em todos os meios, não se podendo mais discernir entre o certo e o errado, o verdadeiro e o falso, o honesto e o corrupto. Quando menos se espera, mais uma bomba cai sem pára-quedas sobre nossas cabeças e surpreende-nos com “novidades” de corrupção, inverdades, segredos e conchavos políticos, acordos por debaixo dos panos e um farto mundo de obscenidades. Foge ao meu entendimento porque o povo ainda se surpreende com coisas tão “corriqueiras” como um presidenciável – agora em busca de uma vaga no senado – guardar “em casa” a soma de 1,34 milhões de reais em dinheiro ou um padre estar envolvido mais uma vez com pedofilia.

O brasileiro já está acostumado a conviver com tudo isso. É como a mulher que apanha do marido e continua sem ir até a delegacia para reclamar porque as agressões, infelizmente, já fazem parte de sua vida e foram absorvidas devido a sua prática reiterada. O que parece é que estas atrocidades têm ocorrido há tanto tempo que o povo esqueceu de reclamar e convive passivamente com todas elas. Basta abrir o jornal e verificar que diariamente surgem novos escândalos. As propinas oferecidas aos oficiais de justiça para favorecerem certos processos, em detrimento de outros; a máfia das multas levantada pelos fiscais de trânsito de Porto Alegre; a duplicidade de votos no orçamento participativo; as invasões de terras promovidas pelo MST sem qualquer fundamento, como da Fazenda Ana Paula, são apenas alguns exemplos que ilustram o que acontece dia após dia no Brasil.

É impressionante como este tipo de coisa se multiplica rapidamente, como se fosse uma praga incontrolável. Até mesmo aqueles que estão do outro lado da mesa, responsáveis pela apuração dos fatos, acabam sendo corrompidos ou, quando não se curvam, são afastados como uma pedra que se encontra no meio do caminho. Isto foi o que aconteceu, por exemplo, com o delegado Deuselino Valadares, que estava prestes a indiciar grandes figurões pelo desvio de verbas da extinta Sudam e foi colocado de lado pela Polícia Federal. Valadares confirmou que seu afastamento ocorreu para evitar que “permaneça no inquérito, termine o trabalho e aponte as cabeças”. Isto significa que nem as “cabeças” e nem quem o afastou de seu trabalho serão investigados?

Quando escrevi para o TeuAdvogado o artigo “Você também é responsável pela crise do judiciário”, apresentei a idéia de que todos os poderes tinham igual responsabilidade pela morosidade do sistema. Hoje, meu pensamento mudou. Melhor dizendo, evoluiu para complementar que, por certo, falta pulso firme ao judiciário ao enfrentar situações de esquiva daqueles que praticam atos contrários ao Direito, sejam eles personagens importantes ou não. Não é crível que se possa enganar tanto a justiça, e por tanto tempo. Se há impunidade, não é simplesmente em razão da precariedade legislativa, mas sim da falta de comprometimento com a justiça e com a seriedade que deveria haver no judiciário. De que adianta decidir e não fazer cumprir? As decisões judiciais não se revestem mais de eficácia, ficando o povo à mercê da vontade particular de algumas pessoas em cumprir os veredictos. O Brasil é, definitivamente, o país do arquivo, do esquecimento.

A cada dia que passa me convenço que a tolerância zero, sempre se respeitando os limites legais, é a única saída viável para restabelecer-se a ordem. Enquanto não adotarmos o regime do “aqui se faz, aqui se paga” continuaremos abrindo os jornais e verificando, diariamente, novas manobras ardilosas de quem detém o poder com o único fim de obter favorecimentos pessoais em detrimento dos interesses coletivos. O brasileiro precisa abrir os olhos contra este conformismo e iniciar um longo processo em busca da justiça e da verdade. Apenas quando todos estiverem conscientes de que tudo isto não pode ser engolido passivamente, dando um basta na tolerância excessiva, é que estaremos aptos a abrir o jornal sem medo do que vamos encontrar.

 
   
OUTROS ARTIGOS
  A força da democracia
Paulo Renato Lima de Magalhães Filho
A Lei que discrimina
Paulo Renato Lima de Magalhães Filho

  Arrolamento sumário: um inventário simples e rápido
Rafael Paiva Cabral
Menos discurso, mais atitude
Paulo Renato Lima de Magalhães Filho

  Propina Legalizada?
Paulo Renato Lima de Magalhães Filho
Seguro de automóvel: Valor Predeterminado X Valor de Mercado
Paulo Renato Lima de Magalhães Filho

  Você também é responsável pela crise do judiciário
Paulo Renato Lima de Magalhães Filho